Uma manhã de pausa. Sem ter nada por fazer. Uma benção no meio da semana. E perfeito para essa minguancia da lua, e que me convida para escrever, ficar quieta em casa e elaborar reflexões após tantas intensidades via Manifesto Sensorial e produções do Palco Intimista.
Depois de ser grande é importante ser pequena, ser invisível. Entrar em contato com uma mediocridade da vida. Não ser central. Não ser um sucesso. Ser um vazio. Um nada. Como diz Milan Kundera:
“A insignificância, meu amigo, é a essência da existência. Ela está conosco em toda parte e sempre. Ela está presente mesmo ali onde ninguém quer vê-la [...] Isso exige muitas vezes coragem para reconhecê-la em condições tão dramáticas e para chamá-la pelo nome. Mas não se trata apenas de reconhecê-la, é preciso amar a insignificância, é preciso aprender a amá-la.”
É necessária muita coragem mesmo para adentrar nesse lugar depois de ser artista. Depois da performance, após umas duas taças de vinho, eu fui sozinha para a casa. E o meu corpo clamava por atenção, afeto e companhia. Fui dormir com aquela angustia e vazio. Não, não fui pra balada. Nunca vou na verdade.
No dia seguinte, fui sentir a sala amanhecendo junto comigo. As marcas dos pés no chão. O tapete branco embolado e atravessado por tantas visceralidades... literalmente, eu comi o tapete com o meu ser erótico. E ali eu já não era nada. Apenas uma mulher com uma vassoura na mão, cansada e varrendo os pós das peles de todxs ali.
Não é possível ser grande depois de ser grande. É necessário morrer junto com as intensidades. Assim como as luas. Ser a natureza do corpo e o corpo como natureza. Ficar sozinha para encontrar a mim mesma. Voltar para baixo, para a terra e para dentro.
Lembrei que terminei a performance do Manifesto Sensorial com o tapete branco embolado em mim e na postura fetal. É sobre isso!
Por muito tempo sempre resisti a esse movimento de esvaziamento. Na verdade, nem sabia dele. Queria apenas a expansão!! Mas o corpo como natureza me ensina e vem me ensinando que, se eu não contrair e respeitar esses ritmos, lá para frente, não tenho duvidas que virão muitos sintomas, assim como já me aconteceu.
Voltar para dentro me dá uma possibilidade, junto com os atravessamentos das angústias, de ter um foco para sentir o que foi aberto na corporeidade da experiência de intensidades. Se não parar, não será possível ver!
Vou terminar esse texto citando um trecho maravilhoso de Heyoan:
“vai se sentar no vazio de veludo negro que existe dentro de você e que está repleto de vida indiferenciada, esperando o momento de nascer e de se manifestar. Você vai descobrir esse profundo vazio dentro da estrela do seu âmago. Fora dessa vida ocorre o ressurgimento da Fênix. Trata-se do seu novo Eu que se manifesta com um aspecto adicional da sua essência do âmago”
Fotografia: Gustavo Jannini
Referências:
Kundera, Milan. A Festa da Insignificância
Brennan, Barbara Ann. A estrela do âmago e o impulso criativo da vida
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